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ENTREVISTA COM SECRETÁRIO ANDRÉ LIMA: DESAFIOS, PROJETOS E PLANOS NA ÁREA AMBIENTAL





 A Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) lançou edição especial da revista Brasília em Debate em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado no dia 8 de junho. Confira abaixo a entrevista concedida pelo secretário André Lima sobre os desafios, projetos e planos na área ambiental do Distrito Federal.

O secretário de Meio Ambiente do Governo do Distrito Federal (Sema), André Lima, destaca que um dos maiores desafios ambientais do DF é a expansão desordenada do território, sobretudo das áreas urbanas, potencializada pelas invasões de áreas públicas em todas as regiões. Diante disso, enumera os danos causados em relação aos serviços de limpeza urbana, drenagem pluvial, produção de esgoto, abastecimento de água, iluminação e desmatamento, que agravam o problema climático e a perda do Cerrado.

As primeiras atividades da Sema citadas pelo secretário nesta entrevista concedida à Brasília em Debate são a “implantação e a proteção efetiva dos parques urbanos, das unidades de conservação da biodiversidade e do Cerrado, e das áreas de proteção de mananciais, além de aprovar o Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE-DF)”.

André Lima faz um balanço dos 150 dias de governo e fala da reestruturação da Sema, a partir da criação de cinco subsecretarias programáticas: 1) Educação e Mobilização Socioambiental; 2) Água e Clima; 3) Áreas Protegidas, Cerrado e Direitos Animais; 4) Resíduos Só- lidos e Saneamento Ambiental; 5) Planejamento Ambiental e Monitoramento. Além disso, “montamos uma equipe de alto nível tanto de subsecretários como de coordenadores temáticos. Já definimos para cada eixo programático um conjunto de prioridades – que agora serão submetidas a consulta pública para concluirmos nosso planejamento estratégico – e a proposta de Plano Plurianual (PPA)”.

Com relação aos recursos hídricos, a Sema pretende recuperar as nascentes e margens de rios (áreas de preservação permanente como a região do rio Descoberto), que ofertam mais de 65% da água que abastece Brasília. Para isso também será preciso elaborar e pôr em prática os Planos de Bacia Hidrográfica.

Na área de energia, André Lima diz que foram criados dois grupos de trabalho (GT) para estudar, entre outras propostas, políticas para o uso da energia solar no DF em escolas públicas, parques e postos de saúde. No que concerne ao saneamento, o secretário informa que “o DF vivencia um grande desafio na área de manejo de resíduos sólidos urbanos, pois temos o maior lixão da América Latina”. E lista ainda as ações a serem implementadas na solução desse problema.

André Rodolfo de Lima, 42 anos, é advogado formado em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), em 1995. No mestrado na Universidade de Brasília (UnB), em 2005, aprofundou estudos sobre os instrumentos de políticas públicas e gestão para desenvolver ações de governo comprometidas com o interesse público.

Com 22 anos de dedicação à área ambiental, sua atuação destaca-se, sobretudo, no campo do desenvolvimento sustentável do Brasil e pela defesa dos direitos dos mais vulneráveis, como comunidades quilombolas, povos indígenas e extrativistas da Amazônia. Fez trabalhos na área jurídica e consultoria em políticas públicas para diversas organizações sociais.

Prestou consultoria também a governos estaduais em legislação socioambiental e ordenamento territorial. Em 2007, foi convidado para assumir a Diretoria de Políticas para a Amazônia no Ministério do Meio Ambiente (MMA). Graças a um plano que ajudou a criar, aprimorar e implementar, o desmatamento na Amazônia caiu mais de 80% em cinco anos.

Foi coordenador de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). É fundador e membro do diretório nacional e do Distrito Federal da Rede Sustentabilidade.

 Em razão do processo da rápida expansão do Distrito Federal, quais são os principais projetos ambientais?

André Lima – Dentre as nossas prioridades e em resposta à expansão desordenada, principalmente das áreas urbanas, a Sema vai priorizar a implantação e a proteção efetiva dos parques urbanos, das unidades de conservação da biodiversidade do Cerrado, e das áreas de proteção de mananciais, além de aprovar o Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE-DF). O zoneamento é um instrumento jurídico que vai orientar os investimentos do governo na proteção e recuperação de áreas ambientais sensíveis e de expansão onde há capacidade de suporte e infraestrutura adequada. Vai estabelecer, portanto, o parâmetro e as diretrizes para gestão do território em todo o DF. Queremos também trabalhar fortemente pela recuperação em escala de nascentes e margens de rios (áreas de preservação permanente) em regiões sensíveis e prioritárias como a região do rio Descoberto, que oferta mais de 65% da água que abastece Brasília. Para isso também será preciso elaborar e pôr em prática os Planos de Bacia Hidrográfica.

Quais as consequências da falta de saneamento e a pressão da urbanização sobre a vegetação e os mananciais do DF? Nossos recursos hídricos estão protegidos?

André Lima – A expansão urbana desordenada potencializada por invasões de áreas públicas que ocorrem em toda as regiões do DF é hoje um dos nossos maiores desafios ambientais. Resulta na sobrecarga de serviços de limpeza urbana, drenagem pluvial, produção de esgoto, abastecimento de água, iluminação e desmatamentos, que agravam o problema climático e a perda do nosso Cerrado. Isso aumenta a pressão e os impactos negativos sobre o solo, a água, o trânsito, o ar e o clima. Infelizmente nosso recurso hídrico hoje sofre muito com a pressão sobre nossa infraestrutura ambiental (áreas de mananciais, Cerrado, nascentes), que está crescendo em ritmo assustador. A crise que vivemos não é a dos recursos hídricos, mas de consciência da população, que ainda não acordou para o fato real de que nossos recursos, principalmente a água, são finitos.

Como podemos aumentar o investimento em energias limpas? É possível diversificar a nossa matriz com fontes renováveis não convencionais como biomassa, eólica e termossolar? Como podemos aplicar técnicas de eficiência energética para reduzir o desperdício de eletricidade em todos os setores: industrial, comercial e principalmente residencial?

André Lima – Brasília tem um grande potencial de uso de energia solar. O uso para aquecimento de água, por exemplo, já é uma realidade em milhares de casas e blocos residenciais. Temos uma incidência solar considerada alta (6 mil Wh/m2). O Brasil não domina a tecnologia de produção de painéis fotovoltaicos. A China é o maior produtor de chapas de silício usadas nos painéis. Isso encarece a aquisição desse equipamento, principalmente em função deficiente para as necessidades do BD – Como podemos aumentar o investimento em energias limpas? É possível diversificar a nossa matriz com fontes renováveis não convencionais como biomassa, eólica e termossolar? Como podemos aplicar técnicas de eficiência energética para reduzir o desperdício de eletricidade em todos os setores: industrial, comercial e principalmente residencial? André Lima – Brasília tem um grande potencial de uso de energia solar. O uso para aquecimento de água, por exemplo, já é uma realidade em milhares de casas e blocos residenciais. Temos uma incidência solar considerada alta (6 mil Wh/m2). O Brasil não domina a tecnologia de produção de painéis fotovoltaicos. A China é o maior produtor de chapas de silício usadas nos painéis. Isso encarece a aquisição desse equipamento, principalmente em função d cação do uso da energia solar no DF. A Sema está formulando um projeto para a implantação dessa tecnologia em escolas públicas, parques e postos de saúde no Distrito Federal. Realizamos em maio duas importantes reuniões com empresas privadas, organizações da sociedade, universidades e gestores públicos de diferentes área de governo. Assim, já temos um primeiro relatório com propostas e demandas de políticas públicas para definirmos o nosso Programa Brasília Solar. Estamos entregando esse relatório ao Governador ainda em junho para darmos os primeiros passos concretos. Também estamos articulando com a Secretaria do Trabalho a possibilidade de produção de painéis fotovoltaicos na nossa Fábrica Social para uso em escolas públicas.

Hoje, o Bioma Cerrado pode ser visto como um dos ecossistemas do planeta mais ameaçados e o segundo mais ameaçado do Brasil. Quais os planos para proteger o Cerrado?

André Lima – Aqui no DF temos, com certeza, menos de 40% de todo o Cerrado ainda vivo. Fora dos parques e unidades de conservação (como o Parque Nacional de Brasília e as Estações Ecológicas de Águas Emendadas e do IBGE) temos menos de 20% do Cerrado preservado. A Sema criou um GT com a Secretaria de Agricultura (Seagri) para implantar o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que pretende cadastrar todas as propriedades rurais e definir a proteção desses 20% que estão fora das áreas protegidas, e para a recuperação das áreas de nascentes e matas ciliares. Criamos o GT Recupera Cerrado e vamos discutir a viabilidade técnica e financeira para recuperarmos as matas ciliares em cerca de 1.500 km de rios no DF nos próximos 10 anos.

Qual sua avaliação sobre o tratamento e o destino final dos resíduos sólidos urbanos?

André Lima – O DF vivencia um grande desafio na área de manejo de resíduos sólidos urbanos, pois convivemos com o maior lixão da América Latina, onde são dispostos cerca de 8 mil toneladas de resíduos sólidos por dia, e tem a atuação de mais de 2 mil catadores cadastrados que proveem a sua subsistência do material recolhido nesta área. Neste contexto, temos de forma concreta um sistema de tratamento extremamente deficiente para as necessidades do DF, pois contamos com duas usinas de compostagem. Uma é datada da inauguração de Brasília e a outra é de meados da década de 1980, que nunca foram atualizadas e que produzem cerca de 100 toneladas/dia de composto adequado para o uso agrícola. Temos a atuação de 34 cooperativas de catadores de material reciclável, que recolhem e encaminham para a reciclagem, mas isso atende apenas 6,33% do total coletado de resíduos sólidos domésticos. Os outros 93,67% são destinados diretamente ao lixão da Estrutural, sem nenhum tratamento prévio. Temos, portanto, uma cadeia de tratamento e de disposição final sem atender às normas ambientais vigentes. Aprovamos este mês (maio) aqui na Sema a chamada pública e já selecionamos as 12 cooperativas de catadores para a construção e reformas dos centros de triagem de resíduos recicláveis. Essa medida é fundamental para o encerramento das atividades do Lixão.

Quais são os obstáculos para a separação de resíduos e a coleta seletiva?

André Lima – Os obstáculos para a separação de resíduos se apresentam em duas vertentes que devem ser trabalhadas. A primeira, a separação de resíduos nas residências e a segunda nos grandes geradores. No primeiro caso, temos a perda de credibilidade dos órgãos públicos junto à sociedade, pois as tentativas de se implantar a coleta seletiva esbarraram em problemas operacionais de processamento e aproveitamento deste resíduo (década de 1990) e na falta de uma política efetiva de educação ambiental, conjugada com uma fiscalização deficiente frente à alta demanda do setor na gestão anterior. Isso posto, temos que trabalhar para o Estado recuperar a credibilidade sobre este tema. No segundo caso, o Serviço de Limpeza Urbana promove a coleta, o transporte e a disposição final de grandes geradores, sem nenhum custo adicional para os mesmos, fazendo com que não haja interesse em promover a segregação dos resíduos, pois não há ganho marginal na atividade, somente aumento de custo. Com a obrigação desses grandes geradores (mais de 100 litros per capita/dia de resíduos sólidos) de dar destinação ambientalmente correta a estes resíduos, o gerador passa a ter interesse em promover a separação desse material, pois quanto menos encaminhar para a coleta, menor o seu custo efetivo.

Há leis que definem instrumentos para enfrentar as mudanças climáticas aprovadas em 15 estados brasileiros. Qual sua visão sobre o tema? Como estão os estudos sobre as emissões dos gases de efeito estufa? Qual o potencial para reduzir as emissões? Quais os possíveis impactos das mudanças no clima? Mais chuva, mais seca? Há planos de longo prazo para a adaptação aos efeitos da mudança no clima?

André Lima – Brasília já sofre com os extremos climáticos. Seja na época de chuva, com os problemas de enchentes e de drenagem urbana, seja na época de estiagem, com a qualidade do ar e as queimadas, que afetam todo o território. Temos um inventário de emissões de gases de efeito estufa em fase de finalização. Podemos adiantar que a principal fonte de emissões do DF é o transporte e a queima de combustível. Brasília tem uma frota de mais de 1,5 milhão de automóveis. A Sema vai trabalhar para a criação de um Fórum Distrital de Mudanças Climáticas. Queremos debater o aprimoramento da Lei de Mudanças Climáticas, aprovada no governo anterior (Lei Distrital 4797/2012), que teve seu principal capítulo (de transportes) inteiramente vetado pelo governador Agnelo Queiroz. E pretendemos desenvolver um plano distrital de enfrentamento das mudanças climáticas. Esse trabalho, assim como tudo que se relaciona com a sustentabilidade, tem que ser feito com os setores interessados e com a população para que, de fato, saia do papel e se torne realidade.

 O ZEE-DF é um dos instrumentos de planejamento territorial conforme o Plano de Governo da atual gestão do GDF. Já houve avanços nessa direção?

André Lima – Sim. O Zoneamento Ecológico-Econômico é um instrumento chave para o ordenamento territorial e o enfrentamento da expansão urbana desordenada. Ele vai oferecer diretrizes para o governo e para o setor privado no desenvolvimento das atividades socioeconômicas no território. Concluiremos a parte técnica do ZEE até julho. No 2º semestre deste ano, vamos fazer as consultas públicas em três regiões e em cinco conselhos: o de Meio Ambiente (Conam), o de Recursos Hídricos (CRH), o de Planejamento Territorial e Urbano (Conplan), o de Desenvolvimento Rural e o de Desenvolvimento Econômico (CDES-DF). E pretendemos encaminhar a proposta ao Legislativo ainda este ano. O ZEE é prioridade máxima da Sema e do Governo do Distrito Federal, pois é instrumento estruturante para a sustentabilidade do desenvolvimento no DF. A sustentabilidade é uma diretriz chave dos eixos programáticos do governador Rodrigo Rollemberg. O Governador criou no final de abril o Comitê Político do ZEE, instância máxima de articulação e composição das ações de governo com o ZEE.

A Codeplan foi também contemplada no plano como órgão de planejamento na produção de mapas, indicadores, sobre Brasília e a Ride. De que modo vai se estabelecer as parcerias entre o DF e Goiás?

André Lima – A Companhia de Planejamento é um órgão estratégico para o desenvolvimento sustentável do DF. A parceria com essa instituição será fundamental para o refinamento das informações utilizadas pelo ZEE e para a definição das diretrizes e formulação do plano de desenvolvimento da região. Contamos com a participação efetiva da Codeplan na Comissão Técnica do ZEE, coordenada pela Sema. E já tivemos algumas reuniões com a equipe técnica da Codeplan inclusive com o presidente Lúcio Rennó, com quem temos afinidades importantes em relação à estratégia de desenvolvimento sustentável para Brasília e a Região Integrada de Desenvolvimento do DF e Entorno (RIDE).

Como o Fundo de Meio Ambiente (Funam) pode ser utilizado? Quais projetos podem ser financiados?

André Lima – O fundo existe desde 1989, quando foi aprovada a lei ambiental do DF (Lei Complementar 41). Temos disponíveis R$ 8 milhões no Funam e pretendemos investir em projetos de educação ambiental nos parques e no Programa de Controle da Poluição Veicular (PCPV). Também pretendemos investir cerca de R$ 1 milhão no CAR, na região da bacia do rio Descoberto, com o propósito de recuperar suas matas ciliares. O grande desafio é darmos efetividade ao fundo e sobretudo criarmos novas fontes de receita para que possamos aumentar o investimento em ações estruturantes da política ambiental.

 O senhor gostaria de acrescentar algo mais?

André Lima – Nestes primeiros 150 dias de governo reestruturamos a Sema com a criação de cinco subsecretarias programáticas: 1) Educação e Mobilização Socioambiental; 2) Água e Clima; 3) Áreas Protegidas, Cerrado e Direitos Animais; 4) Resíduos Sólidos e Saneamento Ambiental; 5) Planejamento Ambiental e Monitoramento. Montamos uma equipe de alto nível tanto de subsecretários como de coordenadores temáticos. Já definimos para cada eixo programático um conjunto de prioridades – que agora serão submetidas a consulta pública para concluirmos nosso planejamento estratégico – e a proposta de Plano Plurianual (PPA). Além disso, realizamos a 1ª reunião conjunta do Conam com o CRH, onde apresentamos um conjunto de propostas de ação para os próximos quatro anos (Mapa do Caminho das Águas). As propostas estão sob consulta no CRH. Realizamos um seminário interno de integração com a Seagri, de Gestão Territorial, de Ciência e Tecnologia (Segeth) e de Infraestrutura, Obras e Serviços (Sinesp). Criamos o GT Recupera Cerrado, integrado por mais de 20 instituições que fazem recuperação florestal no DF, para propor a Política Distrital de Recuperação do Cerrado. Também criamos a comissão para a implantação do CAR e do código florestal no DF em estreita parceria com a Seagri. Criamos o GT Brasília Solar, a Comissão Intersetorial de Direitos Animais e iniciamos um conjunto amplo de ações que envolvem diretamente a sociedade e várias áreas de governo. Além disso já criamos duas unidades de conservação para nosso Cerrado. O Refúgio de Vida Silvestre Mata Seca com uma área de 250 hectares e o Parque Distrital do Tororó com mais 62 hectares de Cerrado protegidos. Portanto, embora seja um começo de governo atípico em função das dificuldades orçamentárias que vivemos, estamos otimistas e muito motivados com os primeiros passos que demos até aqui. Mas é certo que temos muito trabalho pela frente para tornar Brasília um exemplo de sustentabilidade para o Brasil.


Fonte: (*) BD -  Revista Brasília em Debate

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