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FESTA NO CÉU


*Geraldo Lima

E lá se foi Mestre Teodoro ensinar o sotaque do seu bumba meu boi para anjos, arcanjos, querubins e serafins. Como disse São Pedro para Irene, no poema “Irene no céu”, de Manuel Bandeira, quando ela lhe pede licença para entrar, “ – Entra, Irene, você não precisa pedir licença”, assim deve ter dito a Seu Teodoro, vendo-o chegar de chapéu branco de palha, roupa alinhada, a elegância de sempre, porte de nobre e o ar sereno de quem se sabe portador de uma ancestralidade e de uma cultura inabaláveis.

Nunca conversei com Seu Teodoro. Por timidez ou falta de oportunidade, nunca me aproximei dele para lhe perguntar de onde tirava tanta energia e tanta certeza para levar adiante o seu projeto de divulgar e manter vivo o Bumba meu boi no Planalto Central. Vi-o sempre a distância. Admirava aquela figura esguia sob o sol, na maioria das vezes com uma pasta debaixo do braço, indo apressado em busca de ajuda para pôr o Boi para dançar.

Tive a oportunidade de ouvi-lo falar certa vez, no Teatro de Sobradinho, durante uma das apresentações do Bumba meu boi. Não queria falar, mas, por insistência da plateia, acabou falando. Sua fala foi uma aula de cidadania e amor à cultura popular. Lamentei, naquele momento, não ver o teatro cheio de jovens. Teria sido uma oportunidade única de lhes mostrar, através da prática de alguém ligado de fato às raízes da cultura brasileira, o quanto é importante conhecer e amar os valores que nos conferem uma identidade cultural própria.

No mundo globalizado, onde as fronteiras nacionais se rompem para dar passagem, na maioria das vezes, à ação predatória da cultura do país dominante, pessoas como Seu Teodoro Freire (e outras tantas) cumprem o papel de nos manter conscientes da necessidade de se preservar e fazer circular toda a riqueza cultural que nosso país possui. Acima dos modismos, das produções artísticas de gosto duvidoso, feitas apenas para ganhar dinheiro e esvaziar a mente das pessoas, prevalece a força da verdadeira cultura popular. Essa que pulsa na dedicação sem titubeio de mestres como seu Teodoro.

E lá se foi Mestre Teodoro rufar os pandeirões e estalar as matracas na mansidão do céu. O céu, com certeza, depois dessa festa popular, nunca mais será o mesmo.
Evoé, Boi!

(*)Geraldo Lima é professor, escritor e dramaturgo. É autor de Baque (contos, LGE Editora), Tesselário (minicontos, Selo 3 x4, Ed. Multifoco), dentre outros. Bloga em: www.Baque-blogdogeraldolima.blogspot.com e www.o-bule.com. É colaborador do Jornal de Sobradinho/ foto google images.

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