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COLUNA INTERSEÇÃO TEXTUAL por Joel Pires

SOBRADINHO DAS SERRAS E DOS SONHOS

“Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer”
(A.C. /Fernando Pessoa)


Alberto Caeiro é o lado bucólico de Fernando Pessoa. É o heterônimo ligado à natureza, guardador de rebanhos. É o poeta em completa simplicidade, o mestre. Quando penso em Sobradinho, lembro-me de campo, fazenda, serras.

Moro nesta cidade e finquei aqui minha referência, meus ideais, minhas raízes. Neste lugar, vi nascer minha identidade, meus valores, minha visão de mundo e de vida. Uma vida simples e feliz, apesar das dificuldades. Lembro-me de quando chegamos: minha mãe, D. Laura, seis filhos, e nada mais. A esperança era o nosso teto. Tudo ainda era muito incipiente: um comércio de quitandas, ruas por asfaltar, casas simples. Como diria Drummond, “uma cidadezinha qualquer”.

A vida passava devagar: mulheres lavando roupa, meninos jogando bola, cachorros deitados à sombra. Uma calmaria. Carroças passavam e vendiam coquinhos, mangas, abacate. As crianças caminhavam para a escola. O trânsito era tranquilo, aliás, as ruas pareciam muito mais largas. Vizinhos conversavam, cachorros latiam, gatos passavam serenos, donos de si. Até cavalos pastavam na cidade. Um clima quase bucólico. As escolas não tinham muro. As crianças estudavam. Aprendia-se. A cidade ensinava a viver pacificamente. Briga era acontecimento raro e grave. Morte era luto.

Havia circos de lona e palhaços. Parece óbvio. Hoje o circo é outro e os palhaços... Havia ruas de lazer: a meninada, cachorros, bicicletas, música. Bebida era água. A roupa era infantil. A música era lúdica, as brincadeiras também (novamente parece óbvio). Nada de erotismo. As crianças eram crianças. A escola era escola. Os médicos salvavam vidas; hoje ganham dinheiro. Os professores lecionavam; hoje se defendem. Sobrevivem. O palavrão era coisa séria; hoje, banalizou-se. A moral era um valor. A violência era impraticável, condenável; hoje é cotidiana. Morte era tragédia; hoje é acerto de conta.

Contas? Paga-se muito e recebe-se pouco. O carteiro trazia carta; hoje, faturas e mais faturas. Os telhados eram resistentes; hoje são de vidro. Convém não jogar pedras. Estamos expostos ao sol, mas não podemos usar protetor: são caros. Ops! O texto pegou outro rumo. Peço desculpas aos leitores. Mas (enfim!) a cidade continua linda, porque a serra que a envolve é bela e quiçá eterna. Parafraseando Fernando Pessoa, eu diria que da minha serra vejo quanto da terra se pode ver no Universo... sou do tamanho do que vejo.

(*)Por Joel Pires - estudante de Jornalismo , professor de Língua Portuguesa e colaborador do Jornal de Sobradinho.

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