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LEI DO SILÊNCIO

Proposta de mudança na Lei do Silêncio ainda gera divergências
O novo texto da proposta está em trâmite na Câmara Legislativa

(*)  Isabella Conte* Patricia Nadir* 
O músico Tiago Tunes está otimista com as mudanças e com possibilidade de propostas : "Os bares hoje têm medo de multas por causa do som'

Mesmo após muito debate, a proposta de mudança na Lei do Silêncio ainda gera polêmica entre músicos, donos de bares e moradores de áreas residenciais. O projeto, apresentado pelo deputado distrital Ricardo Vale (PT), prevê o aumento dos limites das emissões sonoras, independentemente da região em que o estabelecimento estiver localizado. Hoje, o permitido são 65 decibéis (dB) durante o dia e 55 dB, à noite. Se a medida for aprovada, o limite passará para 70 e 75 dB, nos períodos noturno e diurno, respectivamente. Além disso, a lei também prevê mudanças na fiscalização e na aplicação das penalidades.


Quem está animado com as novas regras é o comerciante Marcelo Mello, 54, dono de um estabelecimento na Asa Norte. Seu bar é palco do evento Sextas Musicais, que leva artistas da capital para se apresentarem ao vivo durante o happy hour. “Apesar de termos música, nunca tivemos reclamações. Temos uma parceria com a vizinhança e sempre procuramos respeitar os limites”, afirma. Ainda assim, ele acredita que a proposta tornará a cidade menos formal e a produção musical ganhará mais espaço. “Brasília vai ser mais descontraída, terá mais participação coletiva. A arte terá espaço e as pessoas poderão se expressar melhor. Isso só trará mudanças boas, pois a população vai desassociar a ideia de que música é barulho”, comemora.

O secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis, garante que, mesmo havendo uma mudança na Lei do Silêncio, ninguém deve ser prejudicado, pois “quase todos os produtores culturais que realizam shows ao ar livre já incorporaram a preocupação cidadã com o direito de todos. Tanto os que frequentam os eventos, como os que não frequentam”.

Tiago Tunes, 20, é músico e concorda que a alteração será muito boa para a população e para a cena cultural de Brasília. “Comecei a tocar com 10 anos, mas, de um tempo para cá, as oportunidades de trabalho diminuíram muito, porque os estabelecimentos não queriam arriscar levar uma multa por conta da música”, explica. Por conta disso, Tiago acredita que as mudanças na lei serão muito positivas e ajudarão os músicos locais a expor a sua arte. “Hoje em dia, Brasília é muito parada durante a noite, apesar de ser uma cidade com muita produção. Acho que as mudanças podem alterar esse cenário”, aponta.

O presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília, Jael Silva, acredita que, hoje em dia, a lei é de difícil execução. “Acho que a legislação atual é impraticável. Em qualquer circunstância, o limite pode ser excedido, independentemente do barulho. Mesmo sem som ambiente ou música ao vivo, os bares são multados”, opina. Ele alega que as mudanças vão representar mais tranquilidade aos empresários. “Com as alterações propostas, haverá mais liberdade e até mais vagas de empregos”, assegura.

Com relação às mudanças na fiscalização, o presidente do sindicato explica que as alterações na fiscalização beneficiarão os comerciantes. “Atualmente, os fiscais não precisam se identificar. Eles podem fazer a aferição sem mencionar o fato”, expõe. Agora, será necessário que eles, além de se identificarem, façam a aferição na residência mais perto do estabelecimento.

Resistência e receio dos impactos

Apesar do apoio de vários segmentos, há quem tema ser prejudicado com o aumento dos decibéis permitidos. Entre essas pessoas, está a estudante Isabela Amaral, de 20 anos. Ela é moradora de Águas Claras há 4 anos e afirma que é contra a mudança. “Se essa proposta for aprovada, vai ficar insuportável. Eu moro no primeiro andar, então escuto tudo. Sofro muito com o barulho dos bares e das festas em outros prédios vizinhos”, relata.



Isabela critica também a falta de educação de alguns na hora de usar o som perto de áreas residenciais. “O pessoal não respeita o direito do próximo e coloca o som alto ou fica gritando. Em uma área residencial, isso atrapalha muito as pessoas que estão tentando dormir ou estudar”, destaca. A estudante conta que, quando ainda morava em Taguatinga, já teve que apelar para a polícia, mas nenhuma viatura apareceu para resolver o problema.

No ano passado, o Instituto Brasília Ambiental (Ibram) registrou 476 autos de infração de poluição sonora. Em 2015, foram realizados 392 registros. Quem também aponta os danos que a nova medida pode causar é a otorrinolaringologista Márcia Voltolini. A especialista explica que a lei atual deveria ser mantida, pois um ruído de maior intensidade pode causar prejuízos à saúde, como o aumento do nível de estresse. “Quanto maior o nível de barulho ao qual uma pessoa está exposta, menos tempo ela pode permanecer no local sem que haja danos à audição. Por exemplo, se a pessoa é exposta a um ruído de 85 db, o máximo de tempo que ela pode permanecer no ambiente são 8 horas. Se aumentar de 85 para 90, o tempo é reduzido pela metade, ou seja, quatro horas”, frisa.

Além disso, Márcia também ressalta que o aumento do volume do som pode acarretar em dificuldade de um sono tranquilo, de conversação em casa, cansaço, dor de cabeça e irritabilidade. “Eu sou contra o aumento da tolerância, pois acho que o ruído já causa incômodo do jeito que está hoje”, finaliza.


(*) *Estagiárias sob a supervisão de Helena Mader

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