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Crime e Espetáculo Midiático

* Por Geraldo Lima

Outra vez, o circo dos horrores. Já assistimos a esse trailer antes: o crime hediondo e o espetáculo armado pela mídia.

Vinte e quatro horas por dia, os fajutos programinhas de televisão, misturando entretenimento e informação, na busca da audiência a qualquer custo, mastigam, trituram, remoem, regurgitam o assunto, a tragédia, o horror, o ato hediondo, expondo detalhes da barbárie sem se importar se crianças estão assistindo ou não. Tudo em nome da “informação”. Já ouvi alguém dizer que as crianças estão chocadas com o crime cometido pelo goleiro Bruno e seus amigos. Dizem que é pelo fato de ele ser um ídolo e jogador de um dos maiores times do país. Pode ser, mas como não ficariam chocadas diante desse espetáculo veiculado por todas as televisões, dia e noite, com riqueza de detalhes? Poderíamos acrescentar sem medo de cometer injustiça: veiculado com mórbida riqueza de detalhes.

O que me assusta mais em tudo isso é a facilidade com que muitas pessoas se deixam envolver emocionalmente com toda essa situação, a ponto de irem para a rua gritar, xingar e, se for preciso, linchar o acusado do crime. Isso reflete o poder da mídia televisiva de envolver o telespectador em sua trama de informações que, às vezes, não tem ainda sustentação na realidade. Lembram-se das cenas de execução pública do passado a que as pessoas assistiam como se estivessem diante de um espetáculo teatral? Pois ainda não saímos desse período. A cena que mais me chocou e deixou indignado foi a de um pai que levou as filhas pequenas para verem a passagem do goleiro Bruno rumo à delegacia. Disse o pai que elas estavam muito tristes pois gostavam muito do goleiro do Flamengo. Mais do que tristes, essas meninas ficarão traumatizadas e cientes de uma realidade da qual não precisariam saber tão cedo.

Dizem os tais programas televisivos, hipocritamente, que a intenção é deixar o telespectador informado de tudo o que está acontecendo. Pergunto-lhes eu: para que o telespectador precisa saber de tudo o que está acontecendo ou que poderia ter acontecido? Por acaso ele vai ajudar a solucionar o crime? Que interessa ao telespectador detalhes que só à polícia interessariam? Aonde esse tipo de informação pode levar o telespectador? Por acaso ele vai crescer intelectual e espiritualmente com informações sobre a vida dos envolvidos? Mas a vida de alguns deles, de uma pobreza intelectual gritante, é exposta sem pudor, como se isso fosse, no momento, o fato que mais nos interessasse.

Triste tudo isso. E vai continuar a ser assim. Mas cabe a nós, cidadãos, a atitude crítica em relação a esse espetáculo midiático da pobreza intelectual: podemos desligar o televisor, mudar de canal, virar a página do jornal ou da revista em busca de algo mais interessante, que possa nos elevar cultural e espiritualmente. Deixemos o circo dos horrores para os que, de fato, sentem algum prazer com a fruição de tudo isso.

(*)Geraldo Lima é autor dos livros A noite dos vagalumes (contos, Prêmio Bolsa Brasília de Produção Literária, FCDF), Baque (contos, LGE Editora/FAC), Nuvem muda a todo instante (infantil, LGE Editora) e UM (romance, LGE Editora/FAC). Publicará pela Editora Multifoco o livro de microcontos Tesselário. Bloga em: www.baque-blogdogeraldolima.blogspot.com e www.o-bule.blogspot.com

Um comentário

Anônimo disse...

Muito bom, mesmo. Temos que escolher o que vamos ler.